Lula e a Estratégia de Aproximação com Evangélicos: Uma Análise em Perspectiva
De olho nas próximas eleições, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) intensificou seus esforços para se aproximar do eleitorado evangélico, repetindo uma estratégia utilizada há duas décadas. A iniciativa inclui recepções a lideranças religiosas, menções em discursos e a participação ativa da primeira-dama, Rosângela da Silva (Janja), em eventos com mulheres das igrejas.
Um Retorno ao Passado com Novos Desafios
Em 2002, Lula já havia adotado uma postura semelhante, mas o cenário atual apresenta nuances significativas. A influência política do segmento evangélico cresceu exponencialmente, e a resistência nos púlpitos se tornou mais evidente. Paralelamente, parlamentares de esquerda expressam preocupações sobre a criação da bancada cristã, que daria ao grupo direito a voto em decisões importantes na Câmara.
Deputados como Reimont (PT-RJ) e o pastor Henrique Vieira (PSOL-RJ) manifestaram oposição à medida, evidenciando o debate interno na esquerda sobre a relação com o segmento religioso.
Aproximações e Embates: Uma Relação Complexa
A estratégia de aproximação se manifesta em encontros como a recente recepção do bispo Samuel Ferreira, da Assembleia de Deus Madureira, no Palácio do Planalto. A possível nomeação de Jorge Messias, ministro da AGU e integrante da Igreja Batista, para o STF, também demonstra a busca por pontes com o segmento, dada sua atuação como “evangélico raiz”.
Samuel Ferreira, que apoiou Jair Bolsonaro (PL) em 2022, representa um desafio para Lula, que enfrentou a oposição de líderes religiosos em eleições anteriores. Em 2002, o líder Manoel Ferreira, pai de Samuel, apoiou o adversário de Lula, José Serra.
Driblando a Resistência: A Estratégia de 2006
Em 2006, Lula conseguiu contornar a resistência, sendo convidado por Manoel Ferreira para um encontro com líderes da Assembleia de Deus. Na ocasião, Lula enfatizou a união entre fé e nacionalidade, lamentando as acusações de que fecharia igrejas, uma tática também utilizada por opositores em 2022.
Marcelo Crivella (Republicanos-RJ), bispo da Igreja Universal, também expressou apoio a Lula, destacando o respaldo dos evangélicos.
O Crescimento do Eleitorado Evangélico
O Censo demonstra o crescimento expressivo do eleitorado evangélico no Brasil. Em 2002, representavam 15,1% da população, número que saltou para 26,9% em 2022, totalizando cerca de 57 milhões de brasileiros.
Contudo, a pesquisa Quaest deste mês revela que a gestão Lula enfrenta desaprovação de 63% dos evangélicos, com 34% de aprovação. A diferença atual é a segunda menor do ano, indicando desafios na estratégia de aproximação.
Pragmatismo e Radicalização: A Visão de Especialistas
Lincoln Secco, professor da USP e autor de “História do PT”, avalia que as lideranças evangélicas mantêm uma postura pragmática, mas as bases não necessariamente formulam valores em termos partidários. Ele ressalta que, embora temas religiosos já fossem importantes, a “fase de radicalização” representada por Bolsonaro não existia antes.
Secco aponta que a aproximação pode ser conveniente para ambos os lados, mas alerta que, caso surja uma alternativa de extrema direita, a maioria dos evangélicos poderá apoiá-la.
Reconhecimento e Desafios Futuros
Em discurso recente, Lula reconheceu as dificuldades na relação com os evangélicos, assumindo a necessidade de aprimorar a comunicação. O presidente afirmou que o erro está na forma como o governo se relaciona com o eleitorado evangélico, e não nos próprios evangélicos.
A estratégia de aproximação com os evangélicos é crucial para Lula, mas enfrenta desafios complexos em um cenário político em constante transformação. A capacidade de dialogar com diferentes vertentes do segmento religioso será determinante para o sucesso da empreitada.